Wednesday, October 31, 2007

True Love Never Dies

No dia do meu quinto aniversário, a casa Mendel estava imbuída de um espírito de festa rija e vivia-se um grande frenesim. A Bia e a minha mãe tinham ido à Baixa para comprar o bolo de anos na Pastelaria Suiça, como era tradicional, e ultimavam-se os preparativos para receber os convidados.

Foi-me explicado que havia uma prenda especial que só chegaria por mensageiro lá pela hora de jantar. Não teria sido preciso, pois, na altura, eu era um ser educado e com boa formação moral e não tinha qualquer necessidade de um presente fora do vulgar. Apagar uma vela em cima de uma bola de berlim teria sido mais do que suficiente para me manter satisfeito, cantando e rindo. Sim, porque, nesse tempo, eu conseguia cantar, e passe a costumeira falta de modéstia, até tinha uma bela voz de soprano.

O dia foi correndo feliz, até que o meu pai me apareceu com o tal embrulho super especial de corrida. Deu-mo para as mãos e ambos os progenitores fizeram imensa propaganda ao seu feito: “Isso é muito especial”, “Foi difícil de arranjar”,”Vais adorar, Ervi”.

Era leve e mole. Tinha um papel verde á volta que eu rasguei com destreza. Era uma peça de roupa? Estranho. Tinha roupa, isso não seria nada de especial. Não espera, é uma camisola do BENFICA! Que bom! Não espera é uma camisola do BENFICA com o número 10 atrás! Maravilhoso! Não, afinal é uma camisola do BENFICA usada pelo Eusébio e com o número 10! Orgasmo Infantil! Não, espera, espera, é uma camisola do BENFICA usada pelo Eusébio no último jogo frente ao Sporting em que ganhámos (Ed: como é óbvio!) 2-1 fora, com golos do Néné e do Artur Jorge, tem o número 10 nas costas e está autografada a marcador preto na frente: “Para o menino Ervi com um beijinho do Eusébio”. Orgasmo Infantil Múltiplo!

Dois dias depois fui, de caraça preta e de camisola do Benfica a dar-me pelas canelas, orgulhosamente mascarado de Eusébio para a festa de Carnaval do colégio. Sentia-me com dois metro e meio de altura. Algumas miúdas podiam não perceber, há umas que ainda hoje não compreendem, mas não há nada que se atravesse no caminho de um amor verdadeiro. Como aos cinco anos quase nenhum dos meus colegas sabia ler, ainda houve umas tentativas subversivas de alguns lagartixas imberbes em me desacreditarem, mas tiveram pouca sorte, pois nada terreno me faria mossa nesse dia, eu estava no topo do mundo.

*****

Passou-se uma semana e a Dona Margarida chamou-me excitada à cozinha. “Menino Ervi, Menino Ervi, venha cá ver, que eu finalmente consegui!” E lá fui eu todo contente ver o que se passava. “Está a ver? Consegui finalmente limpar os rabiscos que o menino fez na escola a marcador desta camisola vermelha! Está como nova, não acha?”

Este vai direitinho para a Bad, uma Portista ferrenha, que de forma involutária me fez recordar esta história de amor verdadeiro.

7 comments:

Inês said...

Esse último parágrafo foi de uma crueldade atroz!! Que belo presente de anos! Recebi um parecido este ano... Infelizmente não autografado pelo Rei mas que me fará lembrar o Maestro para sempre :P

Su said...

lllooolll

Sportinguista que sou, adorei o último parágrafo... só para ser mazinha ;)

eheheheh

Anonymous said...

E o que aconteceu à D. Margarida????
mhmalhoa

Freya said...

se a camisola fosse azul e branca, autografada pelo mourinho ou coisa que o valha, o caso era mais grave!
agora assim... :D

beijo

Gi said...

Peas, penuts and lup(ea)ines!

Cat said...

Well done, D.Margarida!!! :D

...e isso das lagartixas... humpf!

Anonymous said...

para mim uma das histórias mais bonitas que escreveste até hoje, quanto a D. Margrida espero que o forno lá de casa fosse a gás (que acredito que fosse) para lhe dares um tratamento alemão a essa judia horrenda, não é jeffrey?!